24 dezembro, 2013

meu riso só

Todos os dias, o meu primeiro sorriso é visto por ninguém. Por ser tão discreto assim, como ele aprendeu a ser. Uma hora quase exata depois de acordar, ele vem. Não adianta tentar antes disso, nem a necessária cordialidade da vida em sociedade faz um sorriso birrento me aparecer antes. Pontual desse jeito. Metódico, até. E normalmente é aquele riso de canto de boca contidinho,  seja no balançar do ônibus, seja no meio da rua e, temente do julgamento alheio, olho por cima dos óculos levantando a sobrancelha para curiar se ninguém viu ele saindo. Algumas vezes ele quer explodir, e nessas horas, eu tamborilo o pé. É, o sorriso também pode vir lá nas extremidades. Como aquelas pessoas que riem nas mãos, quando dedilham um cavaquinho de som divertido. A felicidade surge onde ela bem quiser.

Eu comemoro o meu primeiro sorriso despercebido. Quer dizer que um novo dia está começando, e muitos outros risos maquinados e guardados durante a noite poderão surgir ao longo de dezesseis ou vinte horas. E não espero que ninguém entenda a demora em produzir o primeiro do dia. É que a máquina está ficando velha, e a latência da noite cansa demais. Então, se avexe não, que o sorriso, quentinho, sai em uma hora. Amanhã de manhã.

22 outubro, 2009

Três anos

...você quer conhecer o terrível dinossauro comedor de cabeças?
Então dá a mão.
Para entrar no incrível quarto bagunçado e escuro a gente precisa estar de mãos dadas, senão a gente se perde.
Toma, ele não morde de noite não.
Nãão, não diz que ele é de brinquedo que ele fica triste!
Ele fala sim, peeelos cotovelos, se você ficar quietinha você vai ouvir...
Certeza que ele quer uma casa feita de almofadas do sofá, eu entendi isso, você também?

(...)

Ui, ouviu o que ele disse? Ele viu uma fada lá no jardim.
Elas piscam, apagam, piscam, rodopiam e voam baixinho pelas flores. Assim, ó.
Mas como, você ainda não viu uma? Ah, elas aparecem quando a gente menos espera, assim, de vez em quando.
Eu? eu vi quando era muito pequena, mas ainda lembro.
Bom, essas fadas pequenininhas, mirradas, a gente só vê quando é pequeno, talvez você ainda veja uma, se olhar bem pro jardim.
Até os oito, eu acho, e mesmo assim, a gente ainda vê umas grandonas, depois que cresce.
Você acha que eu ia mentir pra você?
Eu estou vendo você, não estou? Vai me dizer que você não é uma fadinha, dessas grandonas? Você consegue imaginar que tem asas? E elas brilham? Então. Eu sabia!
Pode dizer no meu ouvido, baixinho.
Ah, que bom que você voa sem tirar os pés do chão, para não assustar a mamãe e a vovó. Muito inteligente isso, gostei.
As asas vermelhas são as mais bonitas mesmo, você sabe escolher bem!

tá, eu prometo.


(ela também disse que quando era pequena, usava uma bóia para nadar, e agora precisa de uma nova, né? aquela ficou pequena- e vai ser toda, toda rosinha)